Getting your Trinity Audio player ready...
|
O desenvolvimento do mercado de capitais tem sido apontado como um dos fatores que contribuem para o desenvolvimento socioeconômico dos países. Essencialmente, o mercado de capitais utiliza a poupança da sociedade para suprir a necessidade das companhias, mas ao fazer a alocação dos recursos de forma eficiente, além dos benefícios diretamente relacionados à função do mercado de capitais em si, como, por exemplo: governança corporativa, redução do custo de capital, aumento da liquidez , entre outros já conhecidos, a viabilização de um número maior de projetos, expansão da produção, geração de empregos e aumento da renda, são alguns exemplos de como o mercado de capitais contribui para o desenvolvimento socioeconômico de um país.
Por muitos anos, o crédito público (BNDES) foi a principal fonte de financiamento de longo prazo para as companhias brasileiras. Apesar do maior tempo para disponibilização dos recursos, que geralmente são desembolsados após as devidas comprovações, os níveis das taxas de financiamento eram consideravelmente inferiores às do mercado de crédito privado. No entanto, no início de 2018, com a modificação da política operacional do banco estatal, em que as taxas de financiamento passaram a ter um plano de serem niveladas com as do mercado em alguns anos, houve uma redução da participação do crédito público na matriz de financiamento das companhias e que foi suprida, em grande parte, pelo mercado de capitais
Outro fator que impulsionou a participação do mercado de capitais na matriz de financiamento das companhias foi a redução da taxa básica de juros (Selic) para os atuais 4,50 % ao ano, o nível mais baixo da história e sem perspectivas de aumentos significativos nos próximos dois anos. Com isso, os investidores de renda fixa, principalmente os institucionais, que anteriormente, tinham como principal estratégia a alocação em títulos de longo prazo do governo federal remunerados pela Selic (LFT), passaram também a adotar uma estratégia de alocação em crédito privado em busca de aumento da rentabilidade de suas carteiras, mesmo que em prol da aceitação de riscos corporativos. O acesso, apetite e liquidez dos investidores para o crédito privado corporativo, gera demanda e contribui para a efetividade das captações por parte das companhias emissoras
O gráfico a seguir, demonstra a evolução das taxas praticadas nas diversas fontes de financiamentos no período de 2012 a 2019, sendo a de debêntures a mais competitiva em 2019. O aumento da participação das debentures na matriz de financiamento das companhias brasileiras é ascendente e está em processo de consolidação, que vem conjuntamente com a evolução do mercado secundário, muito embrionário no Brasil. De acordo com a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais – Anbima, o mercado de capitais doméstico, registrou captação de R$ 346,2 bilhões no ano de 2019 (até novembro), 38,7% superior ao volume captado no mesmo período de 2018. As debêntures representam quase metade do total emitido, com 44,3%, equivalente a R$ 153,5 bilhões.
Com um mercado de capitais mais ativo e protagonista, as companhias que já estão com o seu nível de endividamento adequado e que possuem debêntures emitidas a mercado no seu balanço têm como opção avaliar a estrutura de “Exchange Offer”.
O objetivo é que as emissoras possam capturar benefícios de condições de mercado mais favoráveis para o risco, como, por exemplo, o alongamento do perfil do endividamento, redução do custo de capital de terceiros e melhoras das obrigações contratuais incluindo garantias
Apesar da operação de Exchange Offer ser comum nos Estados Unidos e em outros mercados de capitais maduros e desenvolvidos, no Brasil a operação ainda é pouco conhecida. Nos últimos 12 meses, tivemos aproximadamente 25 operações com essa característica, o que representa somente 0,5% do total da quantidade de debentures ativas no mercado.
A operação é realizada por meio de uma nova emissão de debêntures tradicional, em que a emissora oferece única e exclusivamente para cada investidor da debênture a ser trocada, a opção de aceitar voluntariamente a nova oferta ou decliná-la. Caso o investidor opte pela troca do ativo, a dívida anterior é liquidada com pagamento dos juros ”pro rata die” até a data da liquidação e pelo preço unitário equivalente no mercado secundário, à via de regra, tendo um ágio (prêmio). Caso o investidor, opte por não efetuar a troca, o ativo original (debenture) é mantido com suas condições. No entanto, nesse caso, um dos riscos que também deve ser considerado pelo investidor é o de liquidez, uma vez que, dependendo do volume atingido com a troca, a liquidez do mercado secundário do seu ativo remanescente é reduzida, e, consequentemente, se o investidor, em outro momento optar pela venda, poderá não ter demanda suficiente sendo necessário negociá-lo a preços mais baixos (deságio).
A adoção do Exchange Offer tende a ser benéfica tanto para as companhias emissoras como para os investidores, desde que precificada adequadamente. Do ponto de vista da emissora, é possível negociar remuneração mais adequada ao risco corrente, prazos, flexibilização dos covenants , garantias e ainda diferir no resultado os custos da transação. Do ponto de vista dos investidores, permite alterar o portfolio de investimento , gerando ganhos na marcação a mercado e agilidade na análise do crédito da emissora, dado que o risco já é conhecido e também monitorado.
Contudo, a operação é mais uma alternativa que tem evoluído significativamente no contexto do mercado de capitais brasileiro. A ampliação e a facilidade de acesso a plataformas digitais, assim como a entrada de novos players de mercado (assets, fundos de investimentos, etc.) e instrumentos de financiamento com isenção fiscal para investidores pessoa física (como debentures de infraestrutura) estimulam a utilização no Brasil de instrumentos já aplicados em outros mercados criando um ambiente propício ao desenvolvimento de novos produtos e negócios. Isso tudo, somado ao processo de consolidação por meio das mudanças estruturais como por exemplo, equilíbrio fiscal, estabilidade monetária e segurança jurídica, atrairá cada vez mais investidores e credores para suportar o desenvolvimento econômico em nosso país.
Camilla Aduan de Figueiredo é coordenadora financeira da Unipar Carbocloro S.A. e membro da Comissão de Tesouraria e Riscos do IBEF-SP